sexta-feira, janeiro 23, 2009

BEIJOS DE ARAME-FARPADO

um filme em andamento ou: um pouco da minha história atrás das câmeras

com a palavra, Marco Martins, o diretor:

Antes de decidir realizar o “Veludo e Cacos-de-Vidro” como meu projeto de conclusão de curso em Cinema, eu já vinha tentando viabilizar o filme por fora. Tentei editais, viajei para uma oficina de roteiro no Rio de Janeiro (o que me fez pensar muito sobre algumas questões), perambulei por aí com o projeto debaixo do braço, “sovaqueando o roteiro”, como dizia o Ozualdo Candeias, mestre marginal que me disse isso pessoalmente num festival em Porto Alegre, o FLÔ. Como não descolei os recursos necessários, vi a chance de filmá-lo na Universidade, com o apoio da instituição e dos amigos.

O filme obteve uma ótima repercussão, viajou para diversos Festivais, dentro e fora do Brasil. Graças a ele fiz contato com muita gente do meio cinematográfico e obtive uma resposta muito positiva por parte do público. “Veludo…” ganhou alguns prêmios e causou polêmica. Era de se esperar: o filme faz referências ao período da cinematografia brasileira dos anos 70, pré-pornochanchada, em que os cineastas ousavam além dos limites. Era o Cinema Marginal, o Udigrudi. Meu curta revisita algumas sequências, se apropria da linguagem e da estética dos filmes realizados neste período. Vez ou outra, pretenciosamente, me aproximo de Sganzerla, de Reichenbach, do próprio Candeias. Está tudo ali, diluído, o que entendi e o que não entendi dos filmes destes mestres do “gênero”. Certas sequências são “chupações” descaradas, e isto faz parte da proposta.

No ano que o curta estava percorrendo os Festivais, fui convidado a exibí-lo na TV Cultura, no programa da Ivana Bentes. Pagaram minha passagem para o Rio de Janeiro e lá fui eu, de bermuda e chinelo, dar uma entrevista na TV. No programa estavam presentes eu e o Marcelo Lafitte, com o Bigode de mediador da conversa. Lembro que o Bigode esculhambou a nova cenografia do programa, dizendo que aquilo mais parecia uma zona do que um cenário de um programa de cinema. Ivana se desculpou sorrindo, e sentamos todos nas poltronas cor-de-rosa. A entrevista seguiu bem, o Bigode me chamou de Godard do sul do Brasil, o Laffite falou um pouco do curta dele, e em poucos minutos tudo estava terminado. Voltei para Floripa esperando o dia de ver o filme no ar. Alguns dias depois, recebo a notícia de que o programa NÃO seria exibido. Problemas na fita, que amassou durante o processo de edição. Estranho, muito estranho. O Lafitte levantou a bandeira e o Bigode foi atrás verificar se a história era verdadeira. E não era. Tratava-se de CENSURA por parte da direção do programa. Um prato cheio para a POLÊMICA.

Desde o início pensei em fazer uma trilogia. O primeiro filme tem suas lentes focadas quase que exclusivamente nos conflitos do amor. É a paixão entre um homem e uma mulher perdidos no tempo e no espaço, embriagados de luxúria e desejo. Lembro da primeira conversa que tive com o Renato Turnes, ator generoso e louco, apaixonado pelo que faz e com cinema nas veias, em que eu dizia que Veludo era antes de tudo um cafajeste. Eu queria fazer um filme pesado, eu estava precisando gritar, botar do avesso algumas coisas que havia aprendido na universidade e no decorrer da vida. Quando o Renato topou o papel, as coisas começaram a mudar. Através do humor, ele trouxe a leveza necessária para equilibrar toda a minha revolta e meu ceticismo juvenil.



Julie Cristie eu conheci por indicação de uma amiga que faz uma participação no filme, a Mhirley Lopes, com quem eu havia trabalhado no meu curta anterior, o “Milk Me”. A futura estrela do meu curta surgiu na minha frente com roupas de ginástica, um óculos de aro grosso e com os cabelos amarrados num rabo-de-cavalo. Eu definitivamente tive dificuldade de visualizar a Cacos-de-Vidro que eu tinha em mente naquele momento. Loli, a diretora de arte do filme, que estava ao meu lado, me tranquilizou: “Fica frio, ela não vai entrar em cena assim…”
O filme passou a existir quando botei uma música do Jimi Hendrix para os dois dançarem, no primeiro ensaio. Daí para frente as coisas começaram a ferver. E salve Roberto Carlos!


AS FILMAGENS FORAM MUITO DIVERTIDAS!

Desde o início, lá atrás, quando eu fechei com toda a equipe de trabalharem de graça, fiz uma promessa comigo mesmo: de trabalhar com todos no próximo filme, todos ganhando cachê e com orçamento legal para a produção. Confesso que nunca imaginei que fosse tão difícil e que fosse levar tanto tempo!

Nesse meio tempo eu formei a Vinil Filmes e passei a trabalhar em outros projetos. E o Beijos sempre como um sonho próximo. E agora chegou o momento de filmá-lo! Cinco anos depois, Veludo e Cacos estão de volta!!


Alguns amigos daquela época não estarão nesta próxima jornada: Daniel Caldeira, o diretor de produção do Veludo, mudou-se para São Paulo e é um profissional competente e bem-sucedido no ramo publicitário. Trabalha direto com cinema, com gente grande. Ariadne Catanzaro, assistente de direção, também deixou Floripa e casou-se com um rapaz muito gentil. É professora numa Universidade bacana. Fui dar uma palestra sobre videoclipe lá uma vez. Outros eu perdi o contato e não sei mais por onde perambulam. Ainda assim, consegui formar quase a mesma equipe.


Hoje estou casado com a diretora de arte, o Renato eu vejo todos os dias e fiz novos amigos. Estamos todos mais maduros e experientes, prontos para novos erros. O filme será rodado graças ao prêmio do edital de Vídeo da Cinemateca Catarinense/Governo do Estado-SC, e o transfer para 35mm está pago com a verba captada através da Lei Rouanet. As filmagens acontecerão em março nas cidades de Lages e Florianópolis. No elenco, Renato Turnes e Julie Cristie, Alvaro Guarnieri e Chico Caprario. Participações especiais de Clica Voigt e João Amorim. Por enquanto, apoiados pela Jaque, uma entusiasta do nosso cinema e que tem um restaurante com uma comida deliciosa.

Em breve mais notícias sobre o “BEIJOS DE ARAME-FARPADO”.